quarta-feira, novembro 29, 2006
Tinha comigo um pedaço de ti
tinha comigo um pedaço de ti
e enquanto caminhava
cada passo evocava a tua presença
e tu estavas mais perto
de vez em quando arrancava uma memória
para passar o tempo
e sangrava muito sempre que o fazia
e um sentimento de culpa
invadia-me por dentro
e eu sentia que estavas perto
e ao mesmo tempo tão distante de mim
às vezes perco a memória da tua voz
José Rui Teixeira
e enquanto caminhava
cada passo evocava a tua presença
e tu estavas mais perto
de vez em quando arrancava uma memória
para passar o tempo
e sangrava muito sempre que o fazia
e um sentimento de culpa
invadia-me por dentro
e eu sentia que estavas perto
e ao mesmo tempo tão distante de mim
às vezes perco a memória da tua voz
José Rui Teixeira
terça-feira, novembro 28, 2006
Encantamento
há uma palavra mágica que se diz. essa palavra
é sempre diferente. montanha, precipício, brilho.
essa palavra pode ser um olhar. a voz. um olhar.
essa palavra pode ser o espaço de silêncio onde
não se disse uma palavra. brilho, ...................., montanha.
essa palavra pode ser uma palavra, qualquer palavra.
há uma palavra mágica que se diz. há um momento.
depois dessa palavra, só depois dessa palavra,
pode começar o amor.
José Luís Peixoto
é sempre diferente. montanha, precipício, brilho.
essa palavra pode ser um olhar. a voz. um olhar.
essa palavra pode ser o espaço de silêncio onde
não se disse uma palavra. brilho, ...................., montanha.
essa palavra pode ser uma palavra, qualquer palavra.
há uma palavra mágica que se diz. há um momento.
depois dessa palavra, só depois dessa palavra,
pode começar o amor.
José Luís Peixoto
segunda-feira, novembro 27, 2006
sexta-feira, novembro 24, 2006
O Jogo
(Quadro de Salvador Dali)
Por conseguinte eu ia no jogo. Sabia que elas gostavam que se não fosse muito depressa ao fim.
Antes de tudo, era preciso conversa, ternura, como elas dizem.
Quanto a discursos, não estava eu mal, pois era advogado, nem quanto a olhares, pois tinha sido, na tropa, aprendiz de comediante. Mudava muitas vezes de papel, mas tratava-se sempre da mesma peça. Por exemplo, o número da atracção incompreensível, do «não sei quê», do «não há razões, eu não desejava ser atraído, estava, no entanto, cansado do amor, etc., ...» era sempre eficaz, posto que seja um dos mais velhos do reportório. Havia também o da felicidade misteriosa que nenhuma outra mulher jamais nos deu, que é talvez sem futuro, de certeza mesmo (pois nunca as precauções são demais), mas que, precisamente, é insubstituível. Eu tinha aperfeiçoado, sobretudo, uma pequena tirada, sempre bem recebida, e que o senhor aplaudirá, tenho a certeza. O essencial desta tirada consistia na afirmação, dolorosa e resignada, de que eu não era nada, não valia a pena prenderem-se a mim, a minha vida estava alhures, passava ao lado da felicidade de todos os dias, felicidade que talvez eu preferisse a tudo o resto, mas, enfim, era tarde demais. Sobre as razões deste atraso decisivo, eu guardava segredo, pois sabia que era melhor dormir com o mistério. Em certo sentido, aliás, acreditava no que dizia, vivia o meu papel. Não admira, pois que também as minhas parceiras se entusiasmassem também com o delas. As mais sensíveis das minhas amiguinhas esforçavam-se por me compreender, e este esforço, levava-as a melancólicos abandonos. As outras, satisfeitas por verem que eu respeitava as regras do jogo e tinha a delicadeza de falar antes de agir, passam sem esperar às realidades. Tinha então ganho e duplamente, pois que, além do desejo que sentia por elas, satisfazia o amor que eu me dedicava, verificando de cada vez os meus belos poderes.
Albert Camus (in «A Queda»)
Por conseguinte eu ia no jogo. Sabia que elas gostavam que se não fosse muito depressa ao fim.
Antes de tudo, era preciso conversa, ternura, como elas dizem.
Quanto a discursos, não estava eu mal, pois era advogado, nem quanto a olhares, pois tinha sido, na tropa, aprendiz de comediante. Mudava muitas vezes de papel, mas tratava-se sempre da mesma peça. Por exemplo, o número da atracção incompreensível, do «não sei quê», do «não há razões, eu não desejava ser atraído, estava, no entanto, cansado do amor, etc., ...» era sempre eficaz, posto que seja um dos mais velhos do reportório. Havia também o da felicidade misteriosa que nenhuma outra mulher jamais nos deu, que é talvez sem futuro, de certeza mesmo (pois nunca as precauções são demais), mas que, precisamente, é insubstituível. Eu tinha aperfeiçoado, sobretudo, uma pequena tirada, sempre bem recebida, e que o senhor aplaudirá, tenho a certeza. O essencial desta tirada consistia na afirmação, dolorosa e resignada, de que eu não era nada, não valia a pena prenderem-se a mim, a minha vida estava alhures, passava ao lado da felicidade de todos os dias, felicidade que talvez eu preferisse a tudo o resto, mas, enfim, era tarde demais. Sobre as razões deste atraso decisivo, eu guardava segredo, pois sabia que era melhor dormir com o mistério. Em certo sentido, aliás, acreditava no que dizia, vivia o meu papel. Não admira, pois que também as minhas parceiras se entusiasmassem também com o delas. As mais sensíveis das minhas amiguinhas esforçavam-se por me compreender, e este esforço, levava-as a melancólicos abandonos. As outras, satisfeitas por verem que eu respeitava as regras do jogo e tinha a delicadeza de falar antes de agir, passam sem esperar às realidades. Tinha então ganho e duplamente, pois que, além do desejo que sentia por elas, satisfazia o amor que eu me dedicava, verificando de cada vez os meus belos poderes.
Albert Camus (in «A Queda»)
terça-feira, novembro 21, 2006
See my ships...
sábado, novembro 18, 2006
Esquecimento
Que quer isto dizer, «pensar em alguém»? Quer dizer: esquecê-lo (sem esquecimento, não há vida possível) e despertar muitas vezes desse esquecimento.
Roland Barthes
Roland Barthes
sexta-feira, novembro 17, 2006
quarta-feira, novembro 15, 2006
Através da Chuva e da Névoa
(Foto de Stewart Lloyd-Jones)
Chovia e vi-te entrar no mar
longe de aqui há muito tempo já
ó meu amor o teu olhar
o meu olhar o teu amor
Mais tarde olhei-te e nem te conhecia
Agora aqui relembro e pergunto:
Qual é a realidade de tudo isto?
Afinal onde é que as coisas continuam
e como continuam se é que continuam
Apenas deixarei atrás de mim tubos de comprimidos
a casa povoada o nome no registo
uma menção no livro das primeiras letras?
Chovia e vi-te entrar no mar
ó meu amor o teu olhar
o meu olhar o teu amor
Que importa que algures continues?
Tudo morreu: tu eu esse tempo esse lugar
Que posso eu fazer por tudo isso agora?
Talvez dizer apenas
chovia e vi-te entrar no mar
E aceitar a irremediável morte para tudo e todos
Ruy Belo
Chovia e vi-te entrar no mar
longe de aqui há muito tempo já
ó meu amor o teu olhar
o meu olhar o teu amor
Mais tarde olhei-te e nem te conhecia
Agora aqui relembro e pergunto:
Qual é a realidade de tudo isto?
Afinal onde é que as coisas continuam
e como continuam se é que continuam
Apenas deixarei atrás de mim tubos de comprimidos
a casa povoada o nome no registo
uma menção no livro das primeiras letras?
Chovia e vi-te entrar no mar
ó meu amor o teu olhar
o meu olhar o teu amor
Que importa que algures continues?
Tudo morreu: tu eu esse tempo esse lugar
Que posso eu fazer por tudo isso agora?
Talvez dizer apenas
chovia e vi-te entrar no mar
E aceitar a irremediável morte para tudo e todos
Ruy Belo
terça-feira, novembro 14, 2006
Porquê ?
Ao mesmo tempo que se interroga obcecadamente por que motivo não é amado o sujeito apaixonado vive com a convicção de que, na verdade, o objecto amado o ama mas não diz.
Roland Barthes
Roland Barthes
sexta-feira, novembro 10, 2006
De Repente
Soneto de separação
De repente do riso fez-se pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.
De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento fez-se o drama.
De repente, não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sózinho o que se fez contente.
Fez-se do amigo próximo o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente.
Vinícius de Moraes
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