sábado, março 31, 2007
sábado, março 24, 2007
Águas Mil
Regressaram as chuvas.
Outra foi a água e mais pura.
A minha água afasta a alegria e os pássaros.
A minha água não apaga os incêndios,
nem a loucura.
nem a loucura.
José Agostinho Baptista
quinta-feira, março 22, 2007
quarta-feira, março 21, 2007
terça-feira, março 20, 2007
Adeus
Já gastámos as palavras pela rua, meu amor,
e o que nos ficou não chega
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as mãos à força de as apertarmos,
gastámos o relógio e as pedras da rua
em esperas inúteis.
Meto as mãos nas algibeiras
e não encontro nada.
Antigamente tínhamos tanto para dar um ao
outro!
Era como se todas as coisas fossem minhas:
quanto mais te dava mais tinha para te dar.
Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes
verdes!
E eu acreditava.
Acreditava,
porque ao teu lado
todas as coisas eram possíveis.
Mas isso era no tempo dos segredos.
Era no tempo em que o teu corpo era um aquário.
Era no tempo em que os meus olhos
eram os tais peixes verdes.
Hoje são apenas os meus olhos.
É pouco mas é verdade:
uns olhos como todos os outros.
Já gastámos as palavras
quando agora digo: meu amor,
já se não passa absolutamente nada
e no entanto antes das palavras gastas, tenho a certeza
de que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nome
no silêncio do meu coração.
Não temos já nada para dar
dentro de ti não há nada que me peça água,
o passado é inútil como um trapo
e já te disse; as palavras estão gastas.
Adeus.
Eugénio de Andrade
e o que nos ficou não chega
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as mãos à força de as apertarmos,
gastámos o relógio e as pedras da rua
em esperas inúteis.
Meto as mãos nas algibeiras
e não encontro nada.
Antigamente tínhamos tanto para dar um ao
outro!
Era como se todas as coisas fossem minhas:
quanto mais te dava mais tinha para te dar.
Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes
verdes!
E eu acreditava.
Acreditava,
porque ao teu lado
todas as coisas eram possíveis.
Mas isso era no tempo dos segredos.
Era no tempo em que o teu corpo era um aquário.
Era no tempo em que os meus olhos
eram os tais peixes verdes.
Hoje são apenas os meus olhos.
É pouco mas é verdade:
uns olhos como todos os outros.
Já gastámos as palavras
quando agora digo: meu amor,
já se não passa absolutamente nada
e no entanto antes das palavras gastas, tenho a certeza
de que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nome
no silêncio do meu coração.
Não temos já nada para dar
dentro de ti não há nada que me peça água,
o passado é inútil como um trapo
e já te disse; as palavras estão gastas.
Adeus.
Eugénio de Andrade
quarta-feira, março 14, 2007
A Pele das Coisas
A surda sabedoria
que existe nas palavras
por vezes não se revela.
Tuas mãos necessitam
tocar a pele das coisas
que continuam caladas,
procurando apreender
a razão e o segredo
da sua metamorfose.
Porém a pele das coisas
que chegam ao mundo é
como chama de cristal
acaba por ofuscar
seu próprio entendimento.
Fernando Ilharco Morgado
que existe nas palavras
por vezes não se revela.
Tuas mãos necessitam
tocar a pele das coisas
que continuam caladas,
procurando apreender
a razão e o segredo
da sua metamorfose.
Porém a pele das coisas
que chegam ao mundo é
como chama de cristal
acaba por ofuscar
seu próprio entendimento.
Fernando Ilharco Morgado
domingo, março 11, 2007
quinta-feira, março 01, 2007
Verbos
Sofrer é outro nome
do acto de viver.
Não há literatura
que dome a onça escura.
Amar, nome-programa
de muito procurar.
Mas quem afirma que eu
sei o reflexo meu?
Rir, astúcia do rosto
na ameaça do sentir.
Jamais se soube ao certo
o que oculta um deserto.
Esquecer, outro nome
do ofício de perder.
Uma inútil lanterna
jaz em cada caverna.
Verbos outros imperam
em momentos acerbos.
Mas para que nomeá-los,
imperfeitos gargalos.
Carlos Drummond de Andrade
do acto de viver.
Não há literatura
que dome a onça escura.
Amar, nome-programa
de muito procurar.
Mas quem afirma que eu
sei o reflexo meu?
Rir, astúcia do rosto
na ameaça do sentir.
Jamais se soube ao certo
o que oculta um deserto.
Esquecer, outro nome
do ofício de perder.
Uma inútil lanterna
jaz em cada caverna.
Verbos outros imperam
em momentos acerbos.
Mas para que nomeá-los,
imperfeitos gargalos.
Carlos Drummond de Andrade
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